Alizete dos Santos tem 30
anos e há 6 saiu da universidade com o diploma de licenciatura em geografia. A
recém-formada professora já havia adquirido bagagem pedagógica durante seu
percurso acadêmico, mas nada que pudesse prepara-la para o que enfrentaria
dentro das salas de aula. A distância entre a teoria aprendida e as práticas de
ensino não poderiam deixa-la mais frustrada. “Eu tive um impacto no primeiro
ano; deu vontade de jogar tudo para cima”, conta.
A educadora vivencia
diariamente a realidade da educação pública brasileira. Quando pisou pela
primeira vez em uma sala de aula não imaginou que os recursos pedagógicos
seriam um fator que a impediria de aplicar tudo o que aprendeu ao longo do
curso. “Uma das escolas em que trabalho não tem nem mapa, então eu tenho que
levar os meus”, declara. Mas os inúmeros obstáculos não a impediram de seguir a
carreira de educadora. Mesmo que o primeiro ano tenha sido frustrante, os
inúmeros alunos que passaram pela sua sala de aula a gratificam.
Alizete conhece inúmeros
perfis de alunos. Já trabalhou com alfabetização de jovens e adultos através do
programa Mova Brasil, do Instituto Paulo Freire; com cursos de pré-vestibular e
hoje dá aula para alunos do 6º ano do ensino fundamental e para jovens no
ensino médio. Foi dentro dessa realidade que ela encontrou mais uma dificuldade
enfrentada por inúmeros educadores em todo o país: o bullying.
O bullying é a violência
física ou psicológica intencional e repetitiva, que um indivíduo ou grupo
pratica, causando constrangimento e dor em outra pessoa. A definição do termo
ganha contornos físicos e agressivos dentro das escolas e como muitos
educadores, Alizete não foi preparada para lidar com a situação.
Ela passou anos sendo
preparada para repassar o conteúdo para seus alunos, mas poucas foram as vezes
em que as disciplinas ensinaram a enfrentar situações como a violência dentro
da sala. “Eventualmente a gente toca [no assunto bullying] mas eu acho que não
é suficiente”, diz. “Não tem muitos exemplos de como trabalhar quando me deparo
com determinadas situações, seja de racismo, seja porque é gordo ou
homossexual”.
O pouco preparado deixa
Alizete apreensiva quanto a maneira de agir diante de situações como o
bullying. Ela diz que apesar de não ter habilidades profissionais para lidar
com a violência que vê dentro da sala de aula, tenta conversar com o agressor
em particular para saber os motivos que o fizeram agredir o colega. As
respostas são sempre as mesmas: força do hábito ou falou sem pensar.
Ao falar sem pensar esses
agressores expõe a vítima a uma situação de constrangimento que revolta
Alizete. A educadora, que já sofreu bullying quando mais nova, se coloca como
pessoa do caso e tenta contemporizar a situação exaltando habilidade do aluno
agredido. “Eu procuro valorizar ainda mais [a vítima]: olha que legal, que
ideia bacana, socialize aqui com a turma. Tento estimular aquela pessoa a
levantar a autoestima e independente de outros valores que as pessoas pensam em
julgar, ela tem um valor e algo a contribuir na sala”, declara.
Os métodos vêm tendo
reflexos positivos. A educadora diz que apesar de ter limitações quando se
depara com algumas realidades, o bullying tem cada vez mais diminuído nos seus
horários de aula.
Mas a agressão está longe
de ser um problema de fácil resolução. As táticas que Alizete encontrou para
contornar o problema estão bem longe de resolvê-lo completamente. A educadora
aponta possíveis soluções para aniquilá-lo, como a contratação de psicólogos e
assistentes sociais, mas reconhece que de fato, o bullying é um problema que
precisa de mais atenção do que se dá.
Os alunos que são vítimas
da violência tendem a se retrair. Essa é mais uma coisa que, não fosse a
experiência de sala, Alizete não teria aprendido na universidade. Ela precisa
praticar diariamente o que não aprendeu no curso de licenciatura: observar os
alunos e tentar entender como é o comportamento, tanto do agredido, quanto do
agressor.
Daiany tem 22 anos,
estuda licenciatura em geografia e é cheia de sonhos. A jovem se prepara para
fazer parte dos mais de dois milhões de educadores que existe no Brasil. É
animada, faz o curso que gosta e apesar de ainda estar na universidade já
entrou em uma sala de aula como estagiária. Assim como Alizete, Daiany percebeu
que as coisas são bem diferentes quando de fato você começa a tralhar com a
realidade diária da educação.
Ela não presenciou nenhuma situação de
bullying no período de estágio, mas sabe que isso é um dos muitos problemas que
enfrentará durante sua carreira de professora, e demonstra certo medo quanto a
maneira de agir quando a hora chegar. Daiany não se sente preparada para apaziguar
uma situação que envolva agressão, seja física ou psicológica, entre os alunos.
A estudante revela que a universidade não tem suporte e não prepara os futuros
profissionais da educação para lidar com situações problemas que podem
acontecer.
Alizete protagoniza
diariamente a realidade educacional do país, Daiany ainda não. Alizete já se
deparou com o bullying, Daiany tem medo de quando chegar a hora de enfrenta-lo.
As duas têm em comum, além da formação, o desejo insaciável de mudar a educação
no Brasil, mas a violência é ainda um dos muitos obstáculos que elas
enfrentarão para tornar o país um modelo a ser seguido.
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